terça-feira, janeiro 31, 2006

A face xenófoba do Islamismo

A face mais xenófoba do Islamismo (movimento político baseado numa interpretação radical do Islão, não confundir com a religião islâmica) revela-se no episódio que envolve a publicação de 12 caricaturas do profeta Maomé (ao lado: caricatura de Rasmus Sand Hoyer) pelo jornal dinamarquês Jyllands-Posten seguido do boicote de produtos dinamarqueses, ameaças de expulsão de diplomatas da Dinamarca de países islâmicos como a Arábia Saudita e de protestos dos movimentos islamistas mais radicais presentes na Europa. Ora, sabemos muito bem que na Arábia Saudita praticar outro culto que não seja o Islão dá direito a cadeia. Sabemos também que na Europa dezenas de famosos artistas de origem muçulmana (ex: Jamel Debbouze e Ramzy Bedia) caricaturam com toda a liberdade personagens ligadas a outras religiões como o Pai Natal, o Papa ou os Rabis, e ainda bem que o fazem. Logo, o que resta de todos estes protestos é a típica xenofobia do Islamismo que tem vindo a ser fortemente encorajado e apoiado pela Arábia Saudita. Além deste episódio existem outros da mesma índole que têm vindo a multiplicar-se. Há mais de 10 anos e muito antes dos recentes acontecimentos em França, todas as noites de Natal e Passagem de Ano são incendiados carros em grandes quantidades nas cités francesas. O que revela uma atitude claramente xenófoba da parte dos autores, visto o Natal e a Passagem de Ano não serem festas de tradição muçulmana. Outro conhecido episódio foi o hediondo assassinato de Theo Van Gogh que tem seguimento na perseguição da deputada holandesa Ayaan Hirsi Ali, co-autora do argumento do filme "Submission" que valeu a sentença de morte a Van Gogh, que a obriga a viver escondida sob constantes ameaças de morte.

segunda-feira, janeiro 30, 2006

Munich: o melhor e o mais europeu de Spielberg

Decorrida mais ou menos uma hora de filme e depois de perceber que estava até àquele momento a assistir a um Spielberg quase sem mácula, comecei a suar das mãos à espera daquele momento em que Steven Spielberg arruína totalmente o filme através de uma infantilidade qualquer só para agradar ao espectador americano mais básico. Lembrei-me da cena infantil e de mau gosto da pistola encravada em "A Lista de Schindler" ou do final absolutamente pateta do "Soldado Ryan" depois de mais de duas horas de reprodução histórica notável da II Guerra Mundial. Em "Munich" esse momento não aconteceu e Spielberg realizou finalmente um grande filme. "Munich" é um filme à europeia, que aliás conta com a participação de bons actores europeus (Yvan Attal, Mathieu Kassovitz, Daniel Craig, etc.), onde não há espaço para as habituais lições de moral tão típicas das películas políticas de Hollywood. Em "Munich", Spielberg interpela intencionalmente o espectador sobre o mundo de hoje tendo como referência os acontecimentos dos Jogos Olímpicos de Munique de 1972 e o seu impacto na política entre Israel e a Palestina. Será que mesmo quando temos a certeza absoluta de defendermos uma causa justa isso nos dá direito a praticar os actos mais ignóbeis em nome dessa causa? Até que ponto podemos menosprezar as consequências desses actos? Não serão as soluções utilizadas hoje na luta contra o terrorismo uma repetição em mais larga escala de soluções tentadas e falhadas no passado? É o próprio Avner que nos formula esta pergunta quando interpela o seu superior da Mossad sobre o sucesso da operação "A Ira de Deus". Em dois segundos de filme Avner faz-nos viajar vertiginosamente no tempo, de 72 até hoje, até à eleição do Hamas...

Relacionado: "Histoire secrète du Mossad", um livro muito suspeito do jornalista Gordon Thomas que desmente algumas cenas de Munich, muito provavelmente escrito por encomenda.

domingo, janeiro 29, 2006

Porque é que o Islamismo triunfa por todo lado?

É a pergunta colocada pela edição francesa da Courrier International. Nas últimas eleições realizadas no Egipto, Iraque, Irão, Turquia e Palestina registaram-se vitórias ou subidas significativas dos movimentos islamistas. Só para termos uma dimensão da escalada destes movimentos, aqui ficam os números dos representantes islamistas presentes nos vários parlamentos:

- Turquia: 357 deputados do AKP em 546 eleitos;
- Irão: 190 deputados em 290;
- Iraque: 203 deputados em 275;
- Jordânia: 17 da Frente de Acção Islâmica em 110;
- Líbano: 12 deputados do Hezbollah em 128 ;
- Israel: 2 em 10 na minoria árabe para um total de 120 deputados;
- Egipto: 88 deputados dos Irmãos Muçulmanos em 444;
- Koweit: 16 deputados em 50.

sexta-feira, janeiro 27, 2006

A democratização do Médio Oriente e arredores

Desde que a Administração Bush começou a planear a estratégia da democratização do Médio Oriente através da libertação do Iraque, as coisas não têm cessado de melhorar. Começou logo pela Turquia. O povo Turco certamente inspirado pela boa nova do aliado Americano elegeu um dos governos mais democráticos dos últimos anos. A seguir foi o Irão a dar o exemplo. A eleição desse grande democrata Mahmoud Ahmadnejad teve indubitavelmente a preciosa ajuda da nova estratégia de democratização do mundo. Esta semana coube a vez à Palestina escolher mais um campeão da democracia, do Hamas. Até a Arábia Saudita, o top da democracia do planeta, decidiu brincar às eleições, mas é tudo a brincar e a seguir fica tudo como era dantes, não se vá perder algum valor democrático.

Quando se discutiu a libertação do Iraque, muita gente que conhece o mundo avisou para o perigo da estratégia de democratização do Médio Oriente causar o efeito contrário. Na altura, tinha dois colegas libaneses no laboratório onde trabalhava que me diziam exactamente a mesma coisa. Mas, grandes comentadores (sem dúvida nenhuma conhecedores do Médio Oriente) logo ripostaram dizendo que os avisos eram muito pretenciosos, eram próprios de quem tinha a mania de que sabia como os árabes pensavam e que a realidade era outra. Eu calei-me logo, que a pretensão é um pecado semi-mortal. Hoje só lhes posso dar razão, de facto aquilo é que é democracia exemplar ali para os lados do Médio Oriente.

Andei à procura da definição de democracia
Encontrei-a aqui logo na primeira frase desta crónica do Abrupto. E confere. A frase diz-nos que em Portugal excepto aqueles três partidos (CDS, PSD e PS), todos os outros não são democráticos, o que vai do BE ao PPM. É exactamente esta a democracia dos partidos que governam o Irão e a Turquia. Os representantes desses partidos chegam a uma tribuna e proclamam "este, este e aquele partido são democráticos. Os outros não!".

Diplomata britânico sobre a tortura de prisioneiros pela CIA

Neste artigo do Le Monde podemos ler algumas das declarações de Craig Murray, ex-diplomata britânico no Uzbequistão entre 2002 e 2004, sobre a transferência e a tortura de prisioneiros por parte da CIA:

"j'ai eu la preuve que les Etats-Unis avaient transféré vers l'Ouzbékistan, pour qu'ils y soient interrogés, des prisonniers en provenance de la base de Bagram en Afghanistan."

"Lorsque j'exerçais mes fonctions au Foreign Office, j'ai vu des documents de la CIA dont le contenu provenait pour la plupart de dépositions de prisonniers torturés. Ces documents étaient intitulés "From Detainee Briefing " (Provenant d'une déclaration de détenu) sans que les conditions dans lesquelles cela avait été fait ne soient précisées (...) [Ceci] permet à des gens comme Condoleeza Rice ou Jack Straw de prétendre que, à leur connaissance, ils n'ont jamais fait usage d'informations recueillies sous la torture. En réalité, c'est faux. Au niveau opérationnel, au niveau du travail sur le terrain, chacun sait très bien comment ces information sont obtenues"

quinta-feira, janeiro 26, 2006

E a culpa da derrota da esquerda vai para...

... não sei, não tenho a certeza, nem tenho qualquer tipo de poder divino que me permite identificar O culpado ou OS culpados.
A certeza que tenho é que faltou conteúdo político à esquerda nestas eleições e essa lacuna pode explicar em parte o resultado. Faltaram sobretudo ideias novas à esquerda e faltou diversidade política em relação a recentes eleições. A esquerda apresentou, nada mais, nada menos, que três candidatos repetentes: Soares, Jerónimo e Garcia Pereira. Como temi no momento em que foram anunciadas estas candidaturas, daqui não veio nada de novo. Soares foi o mesmo dos últimos anos, desde o seu mandato de eurodeputado, é um político que acompanha pouco o que de interessante vai acontecendo na política, repete ideias batidas, foi a um Fórum Social, foi a Davos e voltou de lá com o discurso da mediana. O meu hipotético presidente de esquerda tem que surfar mais perto da crista da onda, porque este país já é atrasado que baste. De Jerónimo e de Garcia Pereira veio o habitual zero de novidade política.

Quanto a Louçã, apesar de não ser repetente vinha de duas voltas ao país em outras tantas campanhas. É certo que Louçã foi o que esteve melhor nos debates a dois, isto porque é um dos poucos políticos nacionais que leva a sério a sua preparação política, Louçã estuda, é disciplinado e é rigoroso. Aquilo não é dos treinos nas "reuniões trotskistas em que se debate até à exaustão" como fantasiou Pacheco Pereira no Público. Muitas das reuniões trotskistas em Portugal até são bem fraquinhas, discute-se mais a vírgula do estatuto X e o terceiro suplente da lista Y. Mas os bons debates de Louçã não conseguiram eliminar uma sensação de déjà vu que se instalou entre algum do eleitorado do Bloco. Uma parte do eleitorado BE gosta de diversidade e de plasticidade política. Por muito que se goste de Louçã, muitos preferiam ver a área do Bloco representada por outros personagens, talvez com menos brilhantismo que Louçã, mas que trilhassem novos canais de debate político. Depois pesou em tudo isto o profundo conhecimento mútuo do discurso e do passado de Louçã, dos candidatos repetentes de esquerda e do repetente de direita. Restava a novidade Alegre...

A candidatura de Alegre poderia ter um efeito refrescante nestas eleições, mas não teve. Foi uma desilusão. Foi um retrato do que há de mais conservador no PS. Uma esquerda com tiques anti-europeus e de um nacionalismo inconsequente. Domingo, antes de saírem os resultados, já tinha decidido que não iria às urnas se houvesse segunda volta. Não voto em políticos de esquerda que proferem o que Alegre profere sobre a Europa. É sinal de que não percebe nada do que é hoje o mundo, e um político que não percebe minimamente o que se passa no mundo não pode ser presidente de um país.

O que faltou nestas presidenciais?
À esquerda faltou vanguardismo, faltou ambiente, faltou ordenamento do território, faltou regionalização, faltou laicidade e sexualidade, faltou ciência e tecnologia, faltaram as grandes questões internacionais essenciais a uma presidência, faltou Europa, faltou debater o Modelo Social Europeu, faltou ONU, faltou NATO, faltou o debate sobre o Exército Europeu, faltou PALOP e faltou uma campanha assente num programa e não no ataque ao pecadozinho político do adversário.
E faltaram outros candidatos... Arrisco tardiamente estes nomes que poderiam ter tornado o debate bem mais interessante: Assunção Esteves (PSD), Lobo Xavier (CDS), Carlos Amaral Dias (bastava trocar com Soares na respectiva candidatura) e José Manuel Pureza (BE). Há também uns bloguistas que dariam bons candidatos, mas recuso-me por enquanto a engraxar-lhes o ego.

quarta-feira, janeiro 25, 2006

Descoberto planeta similar à Terra

A descrição da descoberta e do exoplaneta OGLE-2005-BLG-390Lb pode ser consultada neste sítio da ESA.

O novo Bernard-Henri Lévy

Acabadinho de sair.
Enquanto não me chega às mãos aqui fica uma parte do comentário do editor:

" What does it mean to be an American, and what can America be today? To answer these questions, celebrated philosopher and journalist Bernard-Henri Lévy spent a year traveling throughout the country in the footsteps of another great Frenchman, Alexis de Tocqueville, whose Democracy in America remains the most influential book ever written about our country.

The result is American Vertigo, a fascinating, wholly fresh look at a country we sometimes only think we know. From Rikers Island to Chicago mega-churches, from Muslim communities in Detroit to an Amish enclave in Iowa, Lévy investigates issues at the heart of our democracy: the special nature of American patriotism, the coexistence of freedom and religion (including the religion of baseball), the prison system, the "return of ideology" and the health of our political institutions, and much more. He revisits and updates Tocqueville’s most important beliefs, such as the dangers posed by "the tyranny of the majority," explores what Europe and America have to learn from each other, and interprets what he sees with a novelist’s eye and a philosopher’s depth."

A guerra preventiva... pelo emprego!

"Préventivement" é a palavra-chave do excelente filme "Le Couperet" de Costa Gavras e que é proferida logo no primeiro diálogo do trailer do sítio oficial deste filme. Bruno é um engenheiro altamente qualificado que se vê subitamente no desemprego. Bruno tenta encontrar uma nova empresa onde possa oferecer os seus préstimos, mas não é fácil, o seu curriculum é muito específico e as vagas nas empresas acontecem a conta-gotas. Mas os concorrentes de Bruno são também muito poucos, tal é o nível de especialização. Bruno tem a ideia de elaborar uma lista de todos aqueles que tal como ele estão no desemprego e que o poderiam bater no confronto directo dos curricula. Inspirado pelos novos tempos, Bruno decide eliminar todos os engenheiros que teoricamente estão à sua frente... preventivamente!

"Le Couperet" é uma espécie de policial-social, de um humor negro refrescante, recheado de cenas surpreendentes e bem pensadas, onde nada é banal e gratuito. José Garcia interpreta brilhantemente Bruno e inicia aqui possivelmente uma nova fase da sua carreira, desta vez marcada pela qualidade que aliás o recente filme "Caixa Negra" parece confirmar. Julgo que este filme ainda não passou em Portugal e temo que não passe (as chachadas da Disney e de Hollywood consomem muita sala), por isso direcciono-vos já para o DVD, ou então chateiem a cabeça ao director do vosso cineclube mais próximo. Seria uma pena perder este filme.

terça-feira, janeiro 24, 2006

A deslocalização da tortura

Dick Marty, relator da Comissão que está a investigar as detenções secretas de presumíveis terroristas na Europa por parte da CIA, apresentou hoje um relatório preliminar que contém passagens muito graves:

"Il a été prouvé, et jamais démenti que des personnes ont été enlevées, privées de leur liberté et transportées […] en Europe, pour être remises à des pays où elles ont été [...] torturées."

"A travers toutes ces informations et ces nombreux témoignages concordants, on peut affirmer qu’il existe de très nombreux indices, cohérents et convergents, qui permettent de conclure à l’existence d’un système de «délocalisation» et de «sous-traitance» de la torture. Les actes de torture, ou d’atteintes graves à la dignité des détenus en leur administrant des traitements inhumains ou dégradants, sont effectués en dehors du territoire national et en dehors de l’autorité des services secrets nationaux."

Se o autor destas violações fosse um banal país europeu ou uma pseudo-potência asiática caía-lhe logo tudo em cima. Como são os EUA vamos ouvir os comentadores do costume a negar ou desculpabilizar tudo, fazendo letra morta das mesmas leis que servem para que eles possam ter uma vida descasada e confortável nos respectivos países.

segunda-feira, janeiro 23, 2006

On a oublié l'investissement primordial: l'école

O penúltimo parágrafo deste artigo do Figaro sobre as eleições em Portugal faz um resumo certeiro do nosso mal:

"En vingt ans, même si le niveau de vie général a bien augmenté, même si l'on a construit tous les ponts ou autoroutes possibles ici et là, on a bel et bien oublié l'investissement primordial, celui qui fait toute la différence entre le tiers-monde et le monde développé : l'école."

O Borda d'Água Global

Se existisse um Borda d'Água para todo o planeta, seria algo mais ou menos assim. Portanto já sabem, se abrirem o frigorífico e sentirem frio é porque o aquecimento global não existe, é a confirmação inequívoca de que todas as instituições internacionais ligadas à climatologia estão erradas.

domingo, janeiro 22, 2006

Portugal ultrapassado pela República Checa

Segundo a última estatística do PIB per capita (PPC) emitida pelo Eurostat, a Rep. Checa com um resultado de 72,7% da média da UE em 2005 ultrapassou Portugal com apenas 71,1%. Apesar destes números serem apenas previsões, o último PIB per capita calculado em conjunto com a taxa de crescimento do PIB de cada país não deixam espaço a milagres, os valores reais, mais décima menos décima, colocarão Portugal atrás da Rep. Checa. As previsões do Eurostat para 2007 pioram ainda mais o cenário, nesse ano Portugal registaria 68,9% da média da UE e a Rep. Checa 75,9%.
Obviamente que o PIB per capita não é um indicador absoluto da qualidade de vida dos cidadãos de um país, mas neste caso mostra bem o estado de letargia em que nos encontramos. É por estas e por outras que considero que nestas presidenciais se perdeu uma boa oportunidade para debater em profundidade as soluções para ultrapassar a estagnação e o atraso do país. Infelizmente, acha-se mais piada debater as guerras internas do PS com Alegre, se Cavaco fala muito ou pouco de economia e a idade de Soares. Enfim...

Reacções na Rep. Checa
Neste artigo publicado no sítio internet do governo checo dedicado à União Europeia, o autor Vaclav Lavicka constata o feito da economia checa mas alerta que a Rep. Checa não se deve comparar com países como Portugal. Lavicka considera que Portugal se encontra encalhado num fosso económico e aconselha a Rep. Checa a comparar-se com outros países: a Eslovénia, a Áustria ou até a Alemanha.

sexta-feira, janeiro 20, 2006

Presidenciais pobrezinhas II

Exceptuando o período dos debates a dois, o conteúdo do restante debate destas presidenciais foi muito fraquinho. Observei consternado como temas importantes de influência presidencial foram apenas aflorados, sendo o debate fortemente marcado pelos pecados dos candidatos (a traição, a idade, falar de economia, etc.) e pela lavagem de roupa suja do passado. A constelação de "cromos repetidos" que se apresentou às presidenciais deixava antever este tipo de conteúdo político, como aqui tinha alertado. Ainda houve uns frequentes "agora não falo do passado", mas os candidatos não resistiam à pergunta seguinte, era mais forte do que eles, e prontamente no mesmo minuto lembravam um episódio passado.

Considero tudo isto lamentável num país que se encontra estagnado e atrasado. Ficou assim por debater seriamente e com profundidade o papel do Presidente em assuntos importantes como as soluções para combater a estagnação. Vamos continuar a apostar na mão-de-obra barata e na redução de impostos ou vamos apostar na qualificação, na qualidade, na especialização, na ciência e na tecnologia? Vamos continuar a ser um país ultra-centralista ou vamos optar por uma regionalização democrática e efectiva? Sobre as soluções para as grandes questões do nosso atraso falou-se muito pouco. Dá a sensação que achamos normal sermos o país com menores qualificações da Europa (de longe!), o país onde ainda existe um défice de laicidade e de respeito pelas mulheres, onde os imigrantes esperam anos para obter o mais simples documento, onde o ordenamento do território é rigorosamente terceiro-mundista e onde por dois tostões se destrói património histórico ou natural para construir um caixote de 9 andares. Há que juntar a tudo isto as questões internacionais que ficaram por debater. Qual o nosso papel na UE, na ONU, na NATO ou na comunidade PALOP?

Putas na estrada e a "Europa neo-liberal"
Houve momentos em que fui fulminado pelo conservadorismo do debate, sobretudo à esquerda. Cavaco não me surpreendeu, foi o mesmo de sempre, exceptuando duas ou três tiradas para piscar o olho ao eleitorado de centro-esquerda. Mas as posições dos candidatos de esquerda sobre a prostituição fizeram corar de vergonha aquela pequena bandeira nacional que tenho cá dentro de mim. Tirando Louçã, para o resto da rapaziada de esquerda é "putas à beira da estrada" e não se fala mais em bordéis em nome dos direitos humanos. Está bem... Lembro apenas que esta semana foram legalizadas associações de senhoras que se prostituem no Reino Unido e aumentadas as penas ao proxenetismo. Estamos na crista da onda, tal como na questão do aborto, está visto!
Depois há questão já recorrente de alguma esquerda mal informada que gosta de classificar a UE como neo-liberal. Alegre lembrou-se dessa para se demarcar de Soares e juntou-lhe algumas pitadas de patriotismo que já não se usa na esquerda desde o Maio de 68. Ora, a ser verdade que a UE é neo-liberal, então o planeta é ultra-liberal! Onde é que há direitos sociais, tempo de férias, horários de trabalho e assistência médica como existe na Europa? Será na América do Sul das desigualdades? Será na África da exploração? Será na Ásia das 12 horas diárias de trabalho? Será nos EUA dos 20% de habitantes sem cobertura médica e quase 1% na cadeia? Talvez no Canadá... Ou será no nosso miserável país? Já agora porque é que os maiores neo-liberais da Europa são anti-europeístas e são contra o Tratado Constitucional? Além disso, alguém tem que explicar ao homem que a UE já é federalista há muitos anos - ainda antes da nossa adesão - e que a corrente federalista europeia é a que defende o reforço do Parlamento Europeu (logo da cidadania) ao contrário da corrente soberanista que defende mais o Conselho Europeu (onde estão os neo-liberais e os nacionalistas). À custa destas posições euro-cépticas muito mal informadas, Alegre está a conseguir tirar-me a vontade de ir às urnas na segunda volta, se a desgraça for adiada para essa ocasião obviamente.

quinta-feira, janeiro 19, 2006

A importância da data de lançamento da New Horizons

Para que a sonda New Horizons leve apenas 10 anos a chegar a Plutão é necessária a assistência gravitacional do planeta Júpiter. Para que tal aconteça é preciso que Júpiter e Plutão se encontrem em posições relativas bem precisas. Assim, a New Horizons deverá ser lançada até ao próximo 27 de Janeiro para poder fazer uma viagem de 10 anos até Pultão. Se passar essa data, chegará um ano mais tarde. E se o lançamento ocorrer depois de 31 de Janeiro, demorará mais dois anos. A partir de dia 3 de Fevereiro, a assistência gravitacional de Júpiter não será mais possível e a sonda só chegará a Plutão lá para 2020.
Há três dias que o lançamento da sonda tem sido adiado, vamos lá ver se é hoje.

quarta-feira, janeiro 18, 2006

Há 4 anos sem aumento

Desde que voltei a Portugal para trabalhar como bolseiro de pós-doutoramento em Coimbra ainda não fui aumentado uma única vez! O montante da bolsa não é mau para o nível de vida de Coimbra (Lisboa já é outra história), mas comparado com o que se paga no resto da Europa (já nem falo dos EUA) temos vindo a perder terreno perigosamente. Volta a existir uma pressão para sair do país, dado que tudo o resto no meio científico nacional é em geral pior e até hostil aos inúmeros investigadores que tentam voltar ao país. Quatro anos depois, compreendo melhor a violência das críticas do João Magueijo à investigação nacional. Ele tem muita razão.

Por isso apoio inteiramente a iniciativa de hoje da ABIC (Associação dos Bolseiros de Investigação Científica) em que se reivindicam 7 medidas urgentes, que não são nada de complicado e melhoram bastante as nossas vidas. No fundo são condições que já se praticam noutros países europeus há alguns anos, mas que em Portugal continuam por actualizar. O exemplo mais caricato é o regime descontos para a Segurança Social a que estamos sujeitos, que é equivalente ao desconto de um trabalhador que ganha o salário mínimo... Já nem falo aqui das mil e uma situações miseráveis e degradantes a que estive sujeito só porque não tenho declaração de IRS, isto porque as bolsas do Ministério não contam para o IRS.

Presidenciais pobrezinhas

Revejo-me no retrato pouco animado e triste do Bruno (Avatares) e da Isabel (Aba de Heisenberg) sobre estas presidenciais. Num momento em que a economia do país está estagnada e em que Portugal continua a ser um país europeu atrasado do ponto de vista cultural, educacional e científico, estas presidenciais eram demasiado importantes para serem deixadas a candidatos que não centrassem o discurso sobre os desafios futuros, a modernização e o desenvolvimento do país, independentemente da área política. Mas aconteceu o contrário. Vão ser cinco anos de travessia do deserto. A estagnação vai ter mais um aliado: o próximo Presidente da República.

terça-feira, janeiro 17, 2006

Se estivéssemos em Plutão...

- Veríamos o Sol do tamanho de Vénus visto da Terra, seria difícil distingui-lo no meio das restantes estrelas.
- Ficaríamos hirtos e firmes, e congelados com os -240°C.
- Ao olhar para o seu satélite Charon, veríamos um corpo no céu sete vezes maior que a Lua vista da Terra.
- Com sorte talvez conseguíssemos avistar as duas luas adicionais que se julga possuir Plutão.

segunda-feira, janeiro 16, 2006

A melhor fotografia de Plutão



A fotografia (tratada) foi obtida pelo Telescópio Espacial Hubble em 1994 e mostra os dois hemisférios do planeta Plutão. Se tudo correr como previsto, daqui a 19 horas a New Horizons iniciará a sua longa viagem até Plutão onde deverá chegar a 14 de Julho de 2015, para captar imagens deste planeta como nunca foi visto.

Esta é uma das imagens iniciais de Plutão, ainda sem tratamento, em bruto (ver sítio da NASA):

domingo, janeiro 15, 2006

Poeira de estrelas e viagens a Plutão

Enquanto se discute se o "deputado" Alegre deveria ou não rasgar o cartão do partido, se Soares usa ou não Viagra, se Louçã deveria ir para padre e se Cavaco só sabe de economia, há coisas importantes a acontecer no mundo:

- Chegaram do espaço duas colheres de café de pequeníssimos fragmentos do cometa Wild 2 e de poeira interestelar;

- Dentro de dois dias será lançada a primeira missão ao planeta Plutão.

sábado, janeiro 14, 2006

Marte Ataca ou a melhor "versão" da Guerra dos Mundos

Costumo classificar "Marte Ataca" de Tim Burton como a melhor versão do romance "A Guerra dos Mundos" de H.G. Wells. Diga-se de passagem que Wells escreveu outros romances e contos de ficção científica bem mais interessantes (ex: "A Máquina do Tempo" ou "A Ilha do Dr. Moreau") do que esta guerra impiedosa em que os marcianos acabam todos fulminados pelas doenças terrestres. Tanta tecnologia bélica e nem sequer tinham feito uma reles análise ao ar terrestre antes de se aventurarem a partir a loiça toda aqui no planeta azul. O mérito de Tim Burton é que em vez de se limitar fazer mais uma pobre versão do referido romance, Burton tomou como ponto de partida o conceito geral do romance e avacalhou-o deliciosamente. Na versão de Burton são os sucessos de Tom Jones que fulminam os marcianos com muito maior eficácia que qualquer gripe das aves. De facto Tom Jones não é uma ave qualquer, é uma ave rara capaz de surpreender qualquer incauto marciano. Além do mais do ponto de vista científico parece-me muito mais consistente que sejam cantores como Tom Jones, Julio Iglesias, Vítor Espadinha, Toto Cotugno, Johnny Halliday, Anton aus Tirol ou Karel Gott (esta é para os checos) a dizimar os marcianos através do planeta do que qualquer miserável vírus ou bactéria como acontecia no romance de H.G. Wells.

It's not unusual to be loved by anyone
It's not unusual to have fun with anyone,
but when I see you hanging about with anyone
It's not unusual to see me cry,
oh I wanna' die!


"It's Not Unusual", Tom Jones

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Calendário Ciel & Espace

Como já vem sendo hábito, a Ciel & Espace oferece a quem compra a sua edição de Janeiro um belo calendário do ano que começa, onde constam também os principais eventos astronómicos. O mês de Janeiro mostra-nos as colinas de Columbia em Marte, fotografadas pelo Spirit. Agora é só escolher uma parede para contemplar Marte, Saturno (Fevereiro) e os astros que vêm a seguir até 2007. A grande vantagem deste calendário em relação ao da Pirelli, é que se pode afixar em todo lado sem fazer corar ninguém.

domingo, janeiro 08, 2006

Eureka - soirée Thema na Arte

A partir das 19.40 a ARTE brinda-nos com uma soirée THEMA intitulada "Eureka" dedicada à descoberta científica. A soirée THEMA inicia com um filme sobre a vida de Marie Curie e termina com um documentário sobre o inventor das lentes de contacto, o checo Otto Wichterle. É mais um exemplo de serviço público do melhorzinho que há. Para quando um canal deste nível em Portugal ou na Península Ibérica?

sexta-feira, janeiro 06, 2006

Um bom Prós & Contras (actualização)

O último Prós & Contras que teve como participantes Filomena Mónica, Miguel Portas, Pacheco Pereira e o Professor Boaventura foi um bom Prós & Contras, como já não se via há muito. Fez-me lembrar os debates organizados pelas televisões francesas em que o nível anda geralmente no bom. Os debates das presidenciais poderia ser algo deste género, a este nível e debatendo o mesmo tipo de assuntos dentro do âmbito da Presidência da República. Mas foram menos interessantes. Na minha opinião isso explica-se pelo nível médio dos candidatos presidenciais, que no meu entender é mais baixo do que o nível médio dos participantes no último Prós & Contras.

O debate do Prós & Contras valeu pela actualidade e pela qualidade da argumentação, é verdade que houve momentos passíveis de serem considerados demasiado intelectuais para um debate de grande audiência, mas esses momentos são essenciais ao debate público de um país. O problema é estarmos demasiado imersos em retórica bastante superficial. São frequentes os debates nas televisões portuguesas em que predomina a conversa de café, os clichés, a frase feita, o "eu pago e os outros não", o "eu sei e os outros são burros" e a experiência pessoal que se generaliza ao arrepio da estatística mais básica. Fátima Bonifácio, professora universitária, e o seu "dantes é que era bom" é o exemplo típico desta pobreza argumentativa que valoriza três exemplos da vida pessoal em detrimento de estudos académicos. Neste debate também foram citadas experiências pessoais, mas quase sempre enquadradas por resultados de estudos realizados por instituições competentes. Citaram-se também frases isoladas de autores clássicos e modernos, mas foram enquadradas no contexto de épocas e de movimentos precisos. É mais ou menos isto que faz o bom debate. É a ligação consistente entre a argumentação mais abstracta ("intelectual") e os exemplos mais pessoais ou comuns.

Sobre o conteúdo do debate espero ter tempo para lhe dedicar mais umas linhas, pois houve coisas muito importantes que foram ditas e que merecem ser analisadas.

quinta-feira, janeiro 05, 2006

Afonso! Tire a chupeta da boca!

Gosto das pronúncias regionais (do Norte, do Alentejo, do Algarve, de Lisboa, da Madeira, etc.), gosto até desse lisboês com aspirações de ascensão ao jet-set local em que os pais tratam os putos por você. A sério, acho aquilo com muito mais piada que a pronúncia cerrada da Beira Alta e não tenho absolutamente nada contra. Acho que faz parte dos carreiros e das encruzilhadas da evolução da língua.

Vem isto a propósito de um passeio recente por terras alentejanas em que dei por mim enfiado em restaurantes apinhados de famílias lisboetas razoavelmente endinheiradas. O Afonso, o António, o Gonçalo, a Madalena e o Francisco eram putos talvez entre os 3 e os 12 anos de idade que infernizavam um desses restaurantes com berros e correrias, cujos pais tentavam desesperadamente conter, também aos berros, tratando os putos por você. Provavelmente muitos dos meus leitores já assistiram a cenas destas, mas eu confesso que foi a primeira vez. Aquilo é giro que se farta. Mas depois vem a parte mais provinciana da história. Cada vez que os empregados (alentejanos) entravam na sala só se ouvia shotor para aqui e shotora para ali: "O shotor quer mais um bocadinho de molho" ou "Shotora, gostou da baba de camelo?". Aquilo via-se logo que eram mesmo shotores dos autênticos... Olhei para aqueles putos reguilas, para o Afonso e para a Madalena com lula pendurada por cima da chupeta, e imaginei-os daqui a uns anos condenados a serem tratados por shotores e por shotoras assim que entrarem para o primeiro ano de um curso de uma universidade privada qualquer onde se compram exames ao quilo.
O respeitinho é muito lindo e de pequenino é que se torce o pepino.

quarta-feira, janeiro 04, 2006

Mais Ficção Científica (caixa de comentários)

Foram-me deixadas na caixa de comentários da entrada anterior algumas sugestões de ficção científica. Aqui ficam as ligações dos filmes para mais tarde discutir:

"Mulher na Lua" – Fritz Lang
"O Planeta Proibido" - Fred M. Wilcox (nunca o vi do princípio ao fim, mas pareceu-me interessante)
"La Jetée" - Chris Marker
Sugestões do Bruno BD (Projector Lunar)


"The Thing" - John Carpenter
"Code 46" - Michael Winterbottom
"Primer" - Shane Carruth
"Ghost in the shell" - Mamoru Oshii
Sugestões do Nuno Guerreiro

"Strange Days" - Kathryn Bigelow
Sugestão de Hipatia, (Voz em Fuga)

O "Matrix" foi um daqueles filmes que vi e esqueci. Torrou-se ali muito dinheiro em vão. Vi o "Dune" quando era muito jovenzinho, tenho que o rever, é mais um dos essenciais.